quarta-feira, 15 de julho de 2020

Sergio Peres propõe campanha contra o racismo após denúncias de ataques em série no RS


O deputado estadual Sergio Peres (Republicanos), que preside a Comissão de Cidadania e Direitos Humanos, deverá encaminhar à Mesa Diretora da Assembleia Legislativa sugestão de campanha institucional contra o racismo e contra o crime virtual.

O registro de diversos ataques racistas no espaço virtual em atividades do movimento negro esteve em debate hoje (15) no órgão legislativo, que deverá acompanhar as denúncias encaminhadas ao Ministério Público e à Polícia Federal. O assunto reuniu depoimentos de professores universitários e ativistas de coletivos negros que relataram a presença de elementos desconhecidos em salas virtuais de discussão de temas relacionados à negritude, com o uso de sons que remetem aos macacos e imagens de violência e sexo. 

A comissão ouviu, por solicitação da deputada Luciana Genro (PSOL), os casos registrados de ataques racistas em salas virtuais que têm debatido, durante a pandemia, as questões que envolvem a população negra em cumprimento aos horários de atividades acadêmicas, dos Institutos de Educação e das Universidades. O outro assunto foi encaminhado pela deputada Sofia Cavedon (PT), a respeito de fragilidades do acordo coletivo de trabalho do governo com a Emater, que retirou direitos da licença-maternidade de famílias adotivas, entre outras restrições feitas aos servidores. 

No encaminhamento, Luciana Genro sugeriu realização de audiência pública com a presença das autoridades do Ministério Público e Polícia Federal responsáveis pela investigação dos casos relatados. “É evidente que há um ataque sistemático às atividades do movimento negro, não só de militância mas universitária, pesquisa e ensino, e isso é inaceitável”, referindo que os ataques virtuais somam-se à violência praticada pela polícia, de forma sistemática, contra a população negra e periférica no país. A CCDH vai acolher a documentação a ser encaminhada pelos depoentes, e deverá acompanhar as investigações em curso pelos órgãos federais. 

Elisete Santos, do Instituto Federal de Educação Campus Restinga, em Porto Alegre, relatou o primeiro episódio, acontecido no início de julho durante live organizada para debater o racismo a partir do olhar dos moradores da comunidade, cumprindo os estudos acadêmicos através das redes sociais durante a pandemia. Dois homens sem nome e sem rosto entraram na sala virtual e promoveram ataques racistas um pouco antes do início da live, liberando um som de macacos gritando, o que assustou os participantes e, logo em seguida, a equipe de comunicação desativou o áudio daquelas pessoas que retomaram o ataque com a desculpa de que “moravam em um zoológico e que o microfone estava aberto”. Em outro momento, imagens sexuais foram postadas no chat do evento com palavras de cunho racista. Elisete observou que um grupo de pessoas está se sentindo autorizada a promover práticas racistas, intolerância que vem crescendo em especial diante da organização do movimento negro, como ocorreu nos EUA depois da morte de Georg Floyd sufocado por um policial branco, um dos temas em debate na live da Restinga. 

Do Departamento de História da UFRGS, o professor José Rivair Macedo, que pertence ao Núcleo de Estudos Indígenas e Africanos, contou que os ataques cibernéticos estão se repetindo no ambiente acadêmico “em eventos ou situações que se colocam questões raciais ou afrobrasileiros”, como aconteceu no início de julho em palestra de professora sobre nutrição da população negra na Universidade Federal de Santa Maria, UFSM, no curso de nutrição, quando um grupo de dez pessoas solicitou ingresso na sala virtual e na exposição sobre racismo e saúde promovendo xingamentos com tema racista e sexual, postaram fotos e imagens sem relação com o assunto e ameaçaram roubar senhas de cartões de crédito dos participantes. 

A experiência de Rivair Macedo aconteceu dia 11 de junho, em evento virtual de história antiga promovida pela Associação Nacional de Professores de História, da Universidade de Mato Grosso do Sul. O ataque cibernético teve início com vídeos, imagens desconfiguradas, sequências de cenas de filmes de cinema mudo, gritos de ordem bolsonaristas e fora PT, e em seguida foram mostradas cenas de sexo explícito, interrompido o evento que foi reaberto em outro link, com acesso controlado. A universidade anunciou providências para identificar os criminosos, mas Rivair observa que não se trata de fato isolado, pois professora de história da África da UNICAMP, vinculada ao movimento negro, sofreu ataque semelhante no início de junho quando proferia palestra sobre a diáspora negra. Outro episódio foi registrado em universidade do RJ e também em mostra on-line de cinema africano, cuja transmissão foi interrompida. “A sistemática é a mesma, vídeos anônimos, que forçam a interrupção da reunião, com gritos de ordem e pornografia, em eventos organizados por intelectuais, negros ou negras, e são gritos de ordem com cunho político, bolsonarista e racista”, afirmou. 

Vidas negras importam 

A socióloga Suelen Gonçalves, do grupo Ativismo e Pensamento de Mulheres Negras, alertou que se trata de racismo nas instituições, resultado das desigualdades estruturais do país e, em especial, no que diz respeito a gênero e raça, “é construção histórica de um país racista que não enfrenta o debate das nossas vidas”, apontando para a ocupação dos espaços acadêmicos através das políticas inclusivas e ações afirmativas em espaços acadêmicos majoritariamente compostos por elites e pela população não negra, “é nesse contexto que somos atacados”, resumiu. 

Do Coletivo Juntos Negros e Negras, Silas Machado, que é formando do curso de administração pública pela UFRGS, e coordenador do cursinho Emancipa Restinga, preparatório para jovens da periferia disputarem vagas nos Institutos Federais, observou que o momento político está autorizando essas manifestações de racismo. Ele estava na live relatada pela Elisete, e entende que as manifestações do presidente Jair Bolsonaro demonstram desprezo pela vida de modo geral e isso repercute nas vidas negras, que historicamente enfrentam a violência institucional da polícia, como é o caso do jovem Gustavo Amaral, que foi morto “em defesa imaginária do policial”. Essas ações presenciais estão se deslocando para o ambiente virtual, também, alertou Machado, destacando que os espaços da imprensa são majoritariamente brancos e o caso Georg Floyd polarizou essas diferenças, quando obriga a presença de negros para debater a questão negra, como aconteceu na GloboNews. Ele cobra resultado das investigações e da justiça, que em 90% das denúncias de racismo não acolhe e a vítima perde a ação. 

Sofia Cavedon relatou situação vivenciada em live de grupo de esquerda, com ataques no mesmo padrão, que encerrou a transmissão. Jeferson Fernandes também cobrou resultado das investigações. 

Fonte: Agência de Notícias da Assembleia Legislativa do RS

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