quarta-feira, 3 de junho de 2020

Por que conselhos municipais de saúde não podem participar das decisões sobre flexibilização controlada na pandemia?

Comissão de Cidadania  e Direitos Humanos 
debate flexibilização controlada na pandemia 
e ausência de conselhos de saúde nas decisões

No início do terceiro mês de vigência do decreto que determina o isolamento social em função da pandemia de Covid-19 no RS, a Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia, presidida pelo deputado Sergio Peres (Republicanos), ouviu hoje (3), em Assuntos Gerais, o médico epidemiologista Armando De Negri Filho, da UFRGS, e a Chefe da Vigilância Epidemiológica do Centro de Vigilância em Saúde (CEVS), Tani  Ranieri, numa avaliação das subnotificações no estado e a estratégia adotada de flexibilização controlada do distanciamento social. O alerta de que o Conselho Estadual de Saúde e os conselhos municipais, embora com prerrogativas constitucionais, não estão participando das deliberações do governo estadual sobre as estratégias para enfrentar a pandemia, resultou em encaminhamento para que os conselheiros sejam ouvidos na reunião da próxima semana da CCDH.

Por solicitação da deputada Sofia Cavedon (PT), o médico Armando De Negri Filho, da UFRGS, com mestrado em epidemiologia, fez uma abordagem sobre a baixa testagem de Covid-19 no RS, diante de dados da FIOCRUZ que colocam o estado nas últimas posições em testagem de coronavírus do país, e a identificação de mortes por infecção respiratória aguda. A preocupação está relacionada com os critérios adotados pelo governo gaúcho para autorizar a abertura controlada das atividades comerciais, através de bandeiras, com repercussão também na reabertura de escolas infantis, o que está alarmando a comunidade escolar, conforme relatou a deputada, que preside a Comissão de Educação da Assembleia.


O médico Armando De Negri Filho observou, inicialmente, que a pandemia é um assunto de saúde mas alcança toda a sociedade, impacta a economia, a democracia e os direitos civis, tornando-se uma urgência dos direitos humanos, “é preciso ser vista na sua totalidade”, alertou. De Negri critica o enfrentamento inadequado da proteção social e econômica no RS, embora com resultados melhores do que em outros estados, mas com fragilidades ao retornar algumas atividades econômicas. Ele observa que há aumento da circulação do vírus no meio social num contexto de baixa testagem, aumento de pacientes em observação, e aumento no uso dos leitos não intensivos por esses pacientes. A testagem compulsória não permite saber quais pacientes foram contagiados, pondera o epidemiologista, que também refere os dados da FIOCRUZ, através do Observatório Nacional das Síndromes Respiratórias Agudas, somada ao alerta recente da Sociedade de Infectologia do RS, do aumento dez vezes superior ao igual período do ano passado das síndromes respiratórias e em quase 700% dos diagnósticos sindrômicos, “não diz que é Covid mas identifica síndrome respiratória aguda”, indicando a prevalência da Covid como causa.

Outra referência do médico é o trabalho de campo realizado pela UFPEL, apontando “o aumento de circulação do vírus e subnotificação”. De Negri alerta, ainda, para a ausência do Conselho Estadual de Saúde e dos conselhos municipais, instâncias constitucionais com prerrogativas legais, nas decisões do governo estadual, “esvaziar o Conselho e ignorar as redes de conselhos municipais é ignorar a capilaridade de expressão da situação nos municípios”, pondera o médico, que olha para a repercussão da ausência dessa representação nos direitos humanos, “é tornar transparentes os processos decisórios e fazer com que exista a expressão das comunidades”. Explica, por exemplo, que as decisões semanais de mudança das bandeiras, sem a participação ativa das comunidades em cada município, se tornam unilaterais.

Ele também questiona o peso dado à ocupação dos leitos hospitalares e os planos de contingenciamento dos hospitais pelas regiões, que não têm capacidade plena de atendimento. Diante disso, o médico entende que “o princípio da precaução mostraria que neste momento, dado a escalada de casos novos, internações e ocupação de UTIs, a postura seria de precaução e estender o isolamento”, ponderando que “o isolamento está se desconstituindo aceleradamente a partir de mensagem de que tudo está sob controle, mas é percepção tênue considerando que continuamos aumentando os óbitos e ocupação dos hospitais e leitos intensivos”. Também observou que paralelo à Covid-19 continuam existindo outras síndromes respiratórias e outras patologias que não podem ser rejeitadas para abrir espaço na estrutura de saúde apenas para os casos de coronavírus, diante da natural retração desses serviços com a pandemia. Na Ásia e Europa, por exemplo, os setores de saúde estão fazendo campanha para que as pessoas com cardiopatias retomem seus tratamentos.  Outro alerta foi em relação à fragilidade dos trabalhadores da saúde, diante de surtos em alguns hospitais de referência, o que repercutirá no enfrentamento da pandemia. Uma das sugestões foi no sentido de apoiar os municípios para reforço na capacidade imunológica da população através da Atenção Básica à Saúde, adotando o procedimento do Consórcio Científico do Nordeste, com Brigadas de Saúde em busca ativa na comunidade.

A deputada Luciana Genro (PSOL) questionou os critérios adotados pelo governo para autorizar a flexibilização e atribuiu à escolha política da administração, e não uma escolha técnica ou científica, mas econômica, e cobrou posição do governo de cobrança ao governo federal de mais recursos para o RS e assegurar o isolamento social.

Controle de dados

A chefe da Vigilância Epidemiológica do Centro de Vigilância em Saúde (CEVS), Tani  Ranieri, destacou a construção do projeto de distanciamento controlado com a participação das secretarias de Estado, universidades e pessoas de notório saber para definir os melhores indicadores para controlar a situação da pandemia no RS. Explicou que inicialmente o trabalho incluiu o total de casos confirmados por região, tendo em vista o atendimento da retaguarda de hospitalização, prevendo a identificação precoce do estrangulamento hospitalar e atender a população com qualidade e salvar vidas. E também os indicadores em cima do total de casos notificados, mas Tani Ranieri observou que, diante da subnotificação e do trabalho diferenciado na pandemia, com outros testes sendo disponibilizados, e regiões com número maior de pessoas que outras que poderia levar a distorção dessa análise considerando o número de casos dessa região, foi feita a troca pelos casos hospitalizados. Explicou que há controle rígido das notificações de dados dos hospitais, com pouca inconsistência e equipe que está atualizando constantemente, “a troca desse indicador dos casos graves está baseada na situação de maior conhecimento, não estamos menosprezando outros dados”, disse ela, ponderando que “quando chega a ter número importante de casos graves significa grande circulação comunitária naquela região, o que temos mudado são os alertas de segurança que passam de uma bandeira para outra”. Nada foi aleatório, mas baseado em dados e com referência ao fluxo entre as regiões. E destacou o coeficiente de vulnerabilidade dos municípios de cada região, a partir de critérios como densidade populacional, IDH, maior percentual de população acima de 60 anos, incidência de mortalidade precoce por doenças como cardiopatias, e casos de morte precoce até 59 anos, e outros indicadores. Disse, ainda, que foi ampliada a testagem do RS, “estamos testando 100% dos casos de síndrome gripal, para identificar se tem infecção, hoje essa situação está universalizada”.

Dessa forma, o governo tem conseguido acompanhar a ocorrência de casos graves e a velocidade da pandemia, a incidência desses casos nas regiões e o percentual de leitos na região, o que tem permitido maior tranquilidade para negociar estratégias de distanciamento controlado para deter a incidência em determinada região e assistência hospitalar para os pacientes com maior gravidade, afirmou Ranieri. Todos os procedimentos utilizados pelo governo sobre o distanciamento controlado estão disponíveis no site do governo do Estado. As decisões têm sido tomadas pelo Comitê de Dados, coordenado pela Secretaria do Planejamento com participação da secretaria da Saúde, Vigilância Sanitária, universidades e várias entidades. Sem essa ação efetiva, a curva exponencial teria explodido, repercutindo no esgotamento da rede hospitalar, assegurou. Ela solicitou que as dúvidas e indagações dos parlamentares sejam encaminhadas via ofício para a Secretaria da Saúde, para eventuais esclarecimentos. 

Comunidades indígenas e a pandemia

Na Ordem do Dia, os deputados aprovaram requerimento de audiência pública, encaminhado pelo deputado Jeferson Fernandes (PT), para tratar da implementação de políticas públicas nas comunidades indígenas gaúchas durante a pandemia. Antes, o presidente Sérgio Peres deu conhecimento de matéria que pode receber emenda, o PLC 101/2019, da Defensoria Pública. Aguarda a leitura do parecer do relator, deputado Airton Lima (PL), o PL 282/2020, do deputado Valdeci Oliveira (PT), que dispõe sobre uso do nome afetivo nos cadastros das instituições escolares, desaúde, cultura e lazer, por crianças e adolescentes sob guarda provisória em processos de adoção.

Reclamação de Araricá

Antes da exposição em Assuntos Gerais, Sergio Peres referiu a solicitação de audiência da comunidade de Araricá, que reclama das contas de luz da RGE, encaminhadas em desacordo com a legislação vigente durante a pandemia. Destacou comunicado recebido do Procon de São Leopoldo, alertando para a proibição de cobrança pelas concessionárias de luz, água e gás de estimativas de gastos dos últimos meses pelos consumidores. O assunto estava na pauta da Comissão Permanente de Defesa do Consumidor desta quarta-feira.


Sobre o aumento dos casos de feminicídio no RS no período de pandemia, Airton Lima (PL) relatou solicitação endereçada ao presidente da AL, deputado Ernani Polo (PP), para gravação de vídeo institucional sobre esse tema, destacando o trabalho da CCDH nessa área. Sofia Cavedon observou que as deputadas têm feito gravações de alerta em suas redes sociais sobre o feminicídio e locais de ajuda e acolhimento.  

Presenças

Na reunião desta quarta-feira registraram presença o presidente, Sérgio Peres (Republicanos), o vice-presidente, Airton Lima (PL), as deputadas Luciana Genro (PSOL), Sofia Cavedon (PT), Kelly Moraes (PTB) e Any Ortiz (Cidadania), e os deptuados Issur Koch (PP), Jeferson Fernandes (PT), Gaúcho da Geral (PSD) e Rodrigo Maroni (PODEMOS).


Fonte: Agência de Notícias AL/RS

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