quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Especialistas recomendam cautela no retorno às aulas em reunião com deputados da Comissão de Direitos Humanos


A Comissão de Cidadania e Direitos Humanos ouviu hoje (14), em videoconferência, o reitor da UFPEL, Pedro Hallal, e o médico infectologista Rodrigo Santos, do Hospital de Clínicas, a respeito do atual momento da pandemia no RS e em Porto Alegre, tendo em vista a retomada presencial das escolas. Na 42ª semana da pandemia e com a curva de hospitalizações e mortes descendente, a recomendação dos especialistas é de cautela e adoção de planos eficazes para evitar o contágio pelo coronavírus no ambiente escolar. 

O reitor da UFPEL, Pedro Hallal, explicou que as escolas devem definir um plano com a comunidade e a Secretaria de Saúde tendo em vista a infraestrutura e o distanciamento no espaço escolar, sugeriu desativar os bebedouros e adotar outras formas de as crianças beberem água, além do uso de máscaras, apesar de divergências pela idade das crianças. A aglomeração em função das salas pequenas e da lotação das turmas é o ponto mais delicado, afirmou Hallal, recomendando que os protocolos trabalhem com revezamento das turmas em grupos alternados de duas horas, reconhecendo que isso leva tempo e demora para ser planejado. Observou, ainda, que isso vai repercutir no trabalho dos professores. “É hora de montar o plano, não é hora de recomeçar as aulas”, assegurou. 

Sobre as testagens, ele entende que no futebol estão evitando novas contaminações. A possibilidade de uma nova onda de contágios no RS, como está acontecendo na Europa, poderá surgir no próximo ano, isso porque a primeira onda aqui foi mais longa do que em outros países. 

O médico infectologista, coordenador das ações do Hospital de Clínicas no grupo de combate ao coronavírus, Rodrigo Santos, comentou que as ações de bloqueio do contágio foram eficientes no RS e garantiram ao sistema de saúde o atendimento nas UTIs, em especial na capital que não sofreu impactos como em outras regiões do estado. Esse resultado positivo ele atribuiu ao modelo de bandeiras adotado pelo comitê de enfrentamento ao coronavírus, combinado com o distanciamento social precoce e ao fato de a população gaúcha ter colaborado de forma exemplar no início da pandemia. Isso afetou as escolas, que foram imediatamente fechadas, mas repercutiu na capacidade de organização do sistema de saúde para enfrentar a crise sanitária. 

Na discussão sobre o retorno presencial das escolas, Santos observou que neste momento a curva de internações e mortes é descendente há algumas semanas, tanto que o Clínicas registra 80 leitos ocupados com pacientes Covid-19, mas esse número foi de 105 leitos ocupados no auge da crise. Essa queda está sendo registrada também em outros hospitais. Mas o médico entende que não é momento de início completo do retorno às aulas, ressalvando que apenas as séries iniciais poderiam recomeçar uma vez que é baixo o risco de transmissão e infecção entre as crianças menores. Mas isso não se aplica às crianças dos grupos de idade das séries fundamentais ou do Ensino Médio, onde o risco é alto de transmissão do vírus. O distanciamento recomendado deve respeitar dois metros quadrados entre todos. Outro local que inspira cuidados é a cantina, onde a máscara é retirada para a alimentação. O HC registrou casos de contaminação nesse local. Os grupos de risco inspiram preocupação e devem receber orientação especial nos protocolos, destacou o médico. 

O profissional da saúde destaca a adoção pelas escolas dos protocolos sanitários, como o distanciamento dentro das salas de aula e dos espaços físicos e o uso dos equipamentos de proteção individual, os EPIs, mas Rodrigo Santos adverte que mesmo com as recomendações adequadas, nem todos os estabelecimentos de ensino conseguirão atender essas exigências. E disse, ainda, que “a testagem não pode superar a prevenção, o distanciamento e o uso adequado dos equipamentos”. Deu como exemplo os times de futebol, que mesmo realizando testes amplos têm registro de surtos de Covid. A testagem, na opinião do médico, deve ser utilizada com critérios para evitar negligência nos cuidados preventivos. Ele orienta pela testagem de casos suspeitos e seus contatos, e menos testagem ampla e sistemática, sem critérios.

A deputada Sofia Cavedon (PT), que solicitou a conferência dos especialistas vinculados ao Comitê Científico de Enfrentamento à Covid-19, referiu também a situação de professores e funcionários dos grupos de risco, como os asmáticos, que têm os atestados rejeitados pela SMED, assim como a estabilidade da curva que na 42ª semana da pandemia é descendente. Indagou ainda a respeito da contaminação comunitária, uma vez que em creches há registro de contágios em poucas horas depois de as cozinheiras realizarem seu trabalho, e sobre a previsão de testagem em Porto Alegre. 

A deputada Luciana Genro (PSOL) antecipou sua posição favorável ao retorno das aulas presenciais, tendo em vista a curva descendente da pandemia no RS, mas ponderou que as escolas públicas têm deficiências em equipamentos básicos e isso é preocupante para a adequada prevenção do contágio entre os professores, funcionários e estudantes. Apontou a situação dos bebedouros e do espaço físico, comentando que isso precariza o retorno às aulas, questionando sobre o procedimento ideal de prevenção para as escolas. 

Mudança de hábitos

Pedro Hallal referiu a experiência adquirida nestes meses de convívio com o vírus, cujo contágio é menos perigoso que em março, mas ele descarta um final de ano livre da Covid-19 no RS, “estaremos ainda lidando com a pandemia, em nível de preocupação menor do que há alguns meses, mas o coronavírus estará nos incomodando nas festas de fim de ano, infelizmente”.

Na linha de frente desde o início, o reitor da UFPEL apontou erros cometidos, como a previsão de duração da primeira onda, “achava que teria duração menor, como teve em outros lugares, 13 ou 14 semanas, na maioria da Europa seguiu essa tradição das epidemias, mas no Brasil não foi assim”.

Outro erro foi a questão dos anticorpos, “no começo, baseado na experiência do Sars-Covid 1, os anticorpos duravam mais tempo no organismo, hoje sabemos que alguém que teve quadro leve em março se for provado terá resultado negativo”. O erro principal dos gestores no país, afirmou Hallal, não foi negligenciar em relação às máscaras e distanciamento social ou recomendar cloroquina, mas a falta de investimento em testagem, “isso trouxe os piores resultados”. 

Mas ele parabeniza o RS cujos números são melhores do que a maioria da federação, “isso merece elogios, foi trabalho coletivo, pelo governo, prefeituras, os pesquisadores, a mídia e a população gaúcha, que nos primeiros meses deu aula de cidadania, ficando em casa para evitar a circulação do vírus”, garantiu o especialista.

Já o médico Rodrigo Santos destaca o aprendizado destes meses para a população em relação aos procedimentos básicos para evitar o contágio, tanto em relação à Covid quanto outras infecções. Isso vai provocar uma mudança de hábitos, exigindo novas legislações e procedimentos públicos, papel que caberá aos legisladores e gestores no sentido de manter esse debate pois “o risco vai diminuir, mas não vai ser eliminado por completo, teremos a sazonalidade de Covid, como temos de gripe”. A mudança de hábitos é difícil de acontecer do ponto de vista cognitivo e cerebral, “a gente tende a voltar ao padrão anterior porque é mais confortável, mas temos que criar mecanismos novos”, sugere o médico. Isso porque, mesmo com a vacina, não será possível tudo voltar ao normal, o risco vai continuar. Usar a máscara abaixo do nariz ou no queixo, por exemplo, preocupa e para isso os gestores terão que adotar medidas que tornem constante os equipamentos de proteção e seu uso adequado. 

A videoconferência foi presidida pelo deputado Airton Lima (PL). A oitiva foi realizada durante o período de Assuntos Gerais. 

Fonte: Agência de Notícias da Assembleia Legislativa RS

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