terça-feira, 17 de setembro de 2019

Legislação PcD


Um grande debate a favor da inclusão: os avanços e desafios para consolidar os direitos das pessoas com deficiência pautaram a audiência pública que coordenei hoje na Comissão de Cidadania e Direitos Humanos, colegiado presidido por mim na Assembleia Legislativa. 

Encaminhamos ao Poder Executivo Estadual sugestões para fazer valer o disposto na legislação, corrigir distorções e ampliar mecanismos de defesa de garantias constitucionais. 


CCDH quer debater a 
Lei de Acessibilidade Gaúcha e Inclusão

A Comissão de Cidadania e Direitos Humanos, presidida pelo deputado Sérgio Peres (Republicanos), vai “desengavetar” e lutar pela aprovação na Assembleia da Lei Gaúcha de Acessibilidade e Inclusão, documento elaborado em 2018, no governo José Ivo Sartori, pelas diversas entidades que representam cegos, surdos, mudos, cadeirantes, portadores de nanismo e outras deficiências. Ao debater hoje (18), em audiência pública, os avanços e desafios para consolidar o direito das pessoas com deficiência, a aprovação da referida lei foi apontada como prioridade para assegurar estrutura, bens e serviço a esse grupo humano. Os deputados também encaminharão sugestão à Mesa Diretora para a contratação de intérpretes de Libras para todas as comissões técnicas da Assembleia.

Conforme o presidente da CCDH, Sergio Peres, estas duas pautas repercutem algumas das ponderações das entidades que se manifestaram durante a audiência pública, tanto que será dado encaminhamento no sentido de a Mesa Diretora promover a contratação de intérpretes de Libras para todas as comissões da Assembleia, conforme encaminhamento sugerido pela deputada Luciana Genro (PSOL). Hoje, em caráter emergencial, a profissional que fez a leitura dos sinais foi remunerada pelo Partido Republicanos.

De outra parte, Peres anunciou apoio à Lei Gaúcha da Acessibilidade e Inclusão, “vamos desengavetar e fazer com que venha a ser aprovada nesta Casa”, observando que a superação da deficiência está diretamente relacionada à estrutura, bens e serviços que capacitem o bem estar dessas pessoas. Disse, ainda, que as leis existem mas exigem adaptações e adequações que esbarram no poder econômico, “mas vamos trabalhar nesta comissão para que junto com os senhores, façamos prevalecer a lei”. Desde 1980 a ONU emitiu parecer sobre os deficientes, que são 10% da população mundial, conforme a Organização Mundial da Saúde e, no Brasil, 45 milhões de pessoas têm algum tipo de deficiência. Esse percentual de 23,9% da população brasileira, conforme o IBGE, registra limitações visuais, auditivas, motoras e intelectuais. A maior incidência é de deficientes visuais (18%), motora (7%), auditiva (5%) e mental (1,4%).

Diversas autoridades públicas participaram da audiência, como a promotora do MP Estadual, Ângela Salton Rottuno; o presidente da Faders, Marquinho Lang; o vereador Alvoni Medina (Republicanos), que coordena Frente Parlamentar na Câmara da capital pelos direitos de idosos e deficientes; representante da Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos; Carla Brum, da Associação das Crianças e Adolescentes Surdas do RS, que é mãe de criança com deficiência auditiva; e a professora de Libras Vânia Rosa.

O diretor de Pessoas com Deficiência de Canoas, Eric Domingues, abordou o conflito das leis que “estão bem arranjadas no papel mas não condizem com a realidade que vivemos na rua”, alertando para a recente ameaça que sofreu o Benefício de Prestação Continuada (BPC) com as alterações decorrentes da reforma da Previdência, ou os reflexos da reforma trabalhista no acesso ao trabalho às pessoas com deficiência, “ficou mais difícil porque as empresas podem se fragmentar e reduziu o percentual de acesso ao mundo do trabalho para essas pessoas”, afirmou. Ele solicitou apoio da CCDH à Lei Gaúcha de Acessibilidade e Inclusão, que está arquivada na Casas Civil. “Ao longo de dois anos tratamos desse assunto para chegar ao texto da lei que, infelizmente, não conseguiu ser votada”, solicitando empenho para que o assunto tenha andamento no legislativo “sem que nenhum dos dispositivos lá colocados seja perdido”. Pela Faders, Marquinho Lang confirmou que o texto da lei se encontra na Casa Civil, anunciando que até o final do ano poderá retornar para a Assembleia.

O deputado Sergio Peres anunciou que a CCDH “vai até o governador para desarquivar”, enquanto as deputadas Sofia Cavedon (PT) e Luciana Genro (PSOL) também anteciparam apoio. Cavedon sugeriu audência com o Chefe da Casa Civil.

“É briga todo o dia”


Pela Federação Rio-grandense de Entidades de Deficientes Físicos, Nelson Kalil relatou as dificuldades de acessibilidade na maioria dos locais, inclusive na Assembleia, e destacou os reflexos das impossibilidades cotidianas na vida de cada um deles. “Brigamos todo o dia”, resumiu o cadeirante, que não se cala diante dos obstáculos à cadeira de rodas num banheiro público, no cinema, no supermercado e nos acessos de lancherias ou restaurantes, como aconteceu recentemente no Clube do Comércio. Até mesmo para assistir um jogo de futebol é preciso brigar, lamentou Kalil, que reivindicou mas não conseguiu junto ao Sport Club Internacional ingresso para pessoas com deficiência para o jogo desta noite. Mas essa rotina beligerante é evitada pela maioria dos cadeirantes, que optam pela reclusão doméstica como medida preventiva para não contrair outras doenças, em especial as cardíacas. Nelson contou que um amigo, morador do Parque dos Maias e portador de diversas doenças, apto para receber cadeira motorizada, declinou da condição especial justamente para evitar conflitos diários no ônibus, na padaria, “é melhor ficar em casa dormindo ou olhando televisão”, justificou o amigo. Uma das vitórias de Nelson Kalil foi a conquista, depois de dez anos de luta, da construção da rampa na Farmácia de Medicamente do Estado, na esquina da Avenida Borges de Medeiros com a Rua Riachuelo, no centro de Porto Alegre. “As soluções são fáceis e simples e evitariam tantas dificuldades”, desabafou.

Cannabis terapêutica

As crises convulsivas do bebê com 25 dias deixou a professora Liane Pereira em alerta e, logo em seguida, em desespero ao constatar a gravidade da doença da sua recém-nascida. Mais de 60 episódios de crises ao dia e o diagnóstico em 2015 da síndrome severa que provoca epilepsia, colocaram Liane em contato com o canabidiol importado, conquistado por determinação judicial. A criança melhorou e os pais tomaram conhecimento dos habeas concedidos para plantar a cannabis terapêutica, e também obtiveram autorização. Depois de iniciado o tratamento, a menina deixou a cadeira de rodas e caminha com dificuldade, conforme Liane mostrou na fotografia que registrou os primeiros passos dela na escada rolante do shopping de Canoas. “Ela está fechando no final do mês um ano sem crise convulsiva”, comemora a mãe, que lançou à CCDH o desafio de lutar pelo uso terapêutico dessa erva, como está fazendo o Senado Federal, que no dia 19 deverá votar projeto de lei para autorizar o plantio medicinal da cannabis. Ela explicou que tem autorização para plantar 13 pés da erva em casa, quantia suficiente para a produção do óleo que está dando normalidade à vida de sua pequena Carol. Os dois irmãos têm noção de que se trata de remédio, uma vez que a planta é de gênero específico para esse fim. E para maior segurança, o Judiciário faz a fiscalização. 

A ponderação de Liane foi direcionada também para os médicos, uma vez que no RS são os que menos prescrevem a cannabis como tratamento. “Não espere precisar para aprovar, cannabis terapêutica eu aprovo e comprovo”, sugeriu a professora aos deputados, pedindo a encampação dessa luta pela Assembleia Legislativa.

Portadora de nanismo, Gisella Baldi explicou que se trata de uma deficiência física atestada pela medicina. Com 1,13m, ela contou as adversidades diárias no trabalho, como servidora do Hospital Ernesto Dornelles, onde teve que “quebrar” o mobiliário do cartão ponto e do banheiro para que os superiores entendessem suas limitações físicas. Até mesmo no terminal eletrônico do banco ela foi vítima de um colega, pois sem altura para alcançar o teclado, pediu ajuda e teve seu salário subtraído, assunto que foi parar nas instâncias judiciais. Gisella conseguiu estudar porque o pai construiu mesa, cadeira e quadro negro condizente com o seu tamanho e levou para a escola, “eu tinha 66 centímetros na primeira série”. “Sou agressiva 24 horas porque estou cansada de me expor”, disse ela, que participa da Aliança Nacional do Nanismo e já doou seu corpo para a medicina da UFRGS, “vou servir de cobaia”, e terá seu corpo em estudo durante três anos pela universidade. Protestou porque o governo Bolsonaro cortou os recursos destinados à programa que desenvolvia pequeno mas expressivo crescimento nessas pessoas, o antídoto do crescimento, conforme descreveu.

Humilhação nos ônibus

Pela Federação Rio-grandense de Entidades de e para Deficientes Públicos, Liza Censi, que é cadeirante, também ressaltou a necessidade dessa pauta ser assumida com vigor pelas instituições, e reclamou das empresas de ônibus intermunicipais, que portam adesivo de acessibilidade mas não têm o acesso livre, “dá para classificar no Código de Defesa do Consumidor”. Ela explicou que os cadeirantes são colocados e retirados dos ônibus por estranhos, passando constrangimentos, “não temos acesso livre, não temos autonomia”, protestou. Liza contou o caso de menina, semana passada, em deslocamento de Bento Gonçalves até São Leopoldo, que ao ser carregada pelo motorista teve lesões no pé e no joelho, “é descaso e humilhação”. Censi solicitou que a comissão faça uma investigação sobre a regularidade do uso desses adesivos pelos ônibus, sugerindo que retirem quando não prestam o serviço de forma adequada. Também indagou sobre os motivos pelos quais os ônibus acessíveis, com elevadores adequados para os cadeirantes, não estão circulando.

Deficiente visual, Moisés Bauer, do MP Estadual, encerrou os depoimentos pedindo a imediata aprovação da lei estadual de acessibilidade, cuja elaboração teve a participação do MP. Observou que o Brasil tem a legislação mais evoluída do mundo, “é a quinta mais rica em detalhes e direitos”, mas “a lei não foi clara o suficiente em prever sanção para o gestor público e para o ente privado que a descumprem”, disse Bauer, “o máximo que acontece é o estabelecimento comercial ter recusada a renovação do alvará”. Ele fez essa consideração concordando com a ponderação de Cristian Hack, que é deficiente auditivo e sugeriu fiscalização e multa para o descumprimento das regras de acessibilidade.

Fonte: © Agência de Notícias AL | Fotos: Luiz Morem


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